ALPEDRINHA, UMA AGRADÁVEL SURPRESA!...
OUTUBRO 2022
Quando viajamos, muitas vezes passamos por determinada povoação e achamos que não encontramos nela nada que nos possa interessar, além da paisagem. Totalmente errado! Há sempre qualquer coisa de interesse para conhecer e os maiores tesouros de cada lugar nem sempre estão à beira da estrada que seguimos, é necessário procurá-los, conhecer a sua história, falar com as gentes locais e as surpresas aparecem.
Nesta viagem que fizemos pelo Norte do país, em Outubro, a nossa passagem por Alpedrinha não fazia parte dos planos de visita, era apenas um percurso no regresso a casa. Havíamos pernoitado em Belmonte, tal como relatei na publicação anterior e quando chegou a hora de almoço estávamos a chegar a Alpedrinha. Fizemos uma pesquisa para encontrar restaurante e encontrámos um perto da Capela de Stº António, que nos agradou, sobretudo porque havia onde estacionar.
Após o almoço no "Degusta-me" e porque estávamos bem estacionados, resolvemos ir dar uma voltinha pois a tarde estava boa e não havia pressa de chegar a casa. Nesta deslocação a pé pela vila, deparámos com a Igreja da Misericórdia que se encontrava aberta e aproveitámos para visitar.
A igreja, construção do final do séc. XVI, início do séc. XVII, exibe uma fachada simples em cujo portal existe um nicho de granito com a imagem de Nossa Sra. do Socorro. A igreja, de uma só nave, tem anexo um edifício que terá funcionado como hospital, sendo hoje o Lar de Idosos. |
Os altares são ricamente decorados com talha contrastando com a simplicidade do edifício |
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Estas galerias comunicam com o Lar e daqui os utentes poderão assistir às cerimónias religiosas.
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Ao sairmos da igreja reparámos com curiosidade nas pequenas vielas do outro lado da rua e as construções que as limitavam e assim nos fomos embrenhando pelas ruas estreitas e descobrindo um labirinto de ruas e edifícios que nos encantaram e surpreenderam. |
As casas em granito de dois pisos com as típicas varandas em madeira encontram-se ao longo das sinuosas ruas onde, em cada canto se encontra maneira de fazer jardim.
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Antigos Paços de Alpedrinha visto que esta vila foi sede de Concelho entre 1675 e 1855. Em frente ao edifício encontra-se o Pelourinho construído quando foi criado a Concelho.
Pelourinho de Alpedrinha |
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Igreja Matriz de Alpedrinha |
Na capela mor da Matriz encontra-se este interessante orgão de tubos e, quando visitámos a Igreja, tivemos o privilégio de poder apreciar o magnífico som que ele emite pois o organista encontrava-se a tocar. A construção do edifício é do séc. XII, tendo sofrido várias remodelações posteriormente. O orgão de tubos é do séc.XVIII e é um dos elementos de destaque, assim como os sete altares, nas linhas sóbrias da construção.
Ao lado da Igreja Matriz fica a casa de D. Jorge da Costa, o Cardeal de Alpedrinha, foi Arcebispo de Braga e teve lugar de destaque no Vaticano onde chegou a ser eleito Papa no Conclave do Outono de 1503, por morte de Alexandre VI mas não aceitou o lugar, vindo a falecer em Roma em 19 de Setembro de 1508, com 102 anos. D. Jorge da Costa teve grande importância na assinatura do Tratado De Tordesilhas e foi fundador da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa
Continuando à descoberta pelo emaranhado de ruas fomos ter a um dos edifícios mais imponentes desta vila - o Palácio do Picadeiro, construído no séc. XVIII, é um antigo solar de grande magnificência seguindo as linhas do barroco. O edifício já foi usado para vários fins e atualmente alberga uma coleção de uma das artes mais emblemáticas desta terra e que, infelizmente, já se encontra em declínio por não haver quem queira aprender a arte - são os embutidos em móveis.
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Palácio do Picadeiro, edifício de fachada simétrica, com dois pisos e um enorme pátio exterior de onde se tem uma magnífica vista sobre as redondezas. |
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O pátio é limitado por muros que têm, anexos, bancos em pedra. Em cada canto encontra-se um obelisco de 4 metros de altura. Pensa-se que este pátio serviu de Picadeiro e daí o nome dado ao Palácio. No lado sul e exterior ao muro, encontra-se um imponente chafariz mandado construir por D. João V
Chafariz D. João V ou Chafariz Real construído em granito durante o reinado de D. João V. É um chafariz monumental constituído por um baluarte com três faces, cada uma com sua bica e que jorram água para um tanque comum. Por cima do baluarte está uma coroa e as armas reais. Para ter acesso às bicas, existe uma escada de cada lado. Diz a tradição que a bica da direita é para as mulheres casadas, a do meio para as solteiras e a da esquerda para as bruxas. Na base do chafariz existe um outro tanque também com 3 bicas que, possivelmente seria para os animais.
Além deste há outros chafarizes na vila o que nos revela a fartura de água existente nesta região e a importância que a água tem para a vida.
Subindo a calçada romana a partir do Palácio do Picadeiro, encontramos a Capela de S. Sebastião. Este caminho do tempo dos romanos foi utilizado, mais tarde, pelos pastores que nas épocas de transumância, levavam os rebanhos para a serra e vice versa. Esta actividade ainda é celebrada todos os anos em Setembro quando se realiza o Festival da Transumância. Apesar de já não se praticar como antigamente,os habitantes da região procuram recordar este hábito tão antigo, transportando os rebanhos para os melhores pastos, na altura do inverno.Na N18 que atravessa Alpedrinha e perto da capela de Santo António encontra-se um mural representando a transumância.
Não quero deixar de referir também uma imagem que se encontra no Posto de Turismo e que nos surpreendeu pelo inusitado da mesma. É a imagem de S. Jorge - Padroeiro do município de Alpedrinha (actualmente extinto). Esta imagem, em madeira policromada, foi mandada fazer pelo Município no séc. XVIII , tendo a escolha do padroeiro recaído sobre S. Jorge por, segundo a tradição, se pretender homenagear onomasticamente o Cardeal D, Jorge da Costa, natural de Alpedrinha. Esta imagem apresenta a curiosidade de dispor de um sistema de articulação de braços e pernas que, juntamente com a postura equestre, permitia que fosse colocado no dorso de um cavalo e participar em actos públicos como as procissões e outras solenidades de Alpedrinha. Ao ser extinto o Concelho de Alpedrinha, a imagem foi transferida para o Fundão, estando exposta no Salão Nobre dos Paços do Concelho contudo, todos os anos saía na procissão do Corpus Christi, uma das tradições mais importantes da vila. Todavia esta imagem sempre teve uma grande carga simbólica para os habitantes de Alpedrinha que, desde logo lamentaram a sua saída desta vila e tudo fizeram para a poder recuperar, o que veio a acontecer em 1 de Setembro de 2012, passados 157 anos.
Muita coisa haveria ainda para descobrir nesta pequena terra situada na encosta sul da serra da Gardunha, a cerca de 500m de altitude e actualmente pertencendo ao concelho do Fundão mas que, como já referi, chegou a ser sede de Concelho, o que ajuda a explicar o grande número de solares e casas senhoriais, Capelas e fontenários que são monumentos, testemunho em pedra das famílias abastadas que por aqui passaram. Não admira, portanto, que aqui se tenha construído o primeiro teatro das Beiras, com 200 lugares sentados e 20 camarotes. O edifício ainda existe e é lá que funciona a Companhia de Teatro de Alpedrinha. Assim como este, tantos outros lugares ficaram por conhecer nesta nossa visita... Havemos de voltar e continuar a descobrir os segredos desta terra tão cheia de história e de memórias!
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